sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Resenha 13: "Cinco Anos de Noivado", de Nicholas Stoller

Emily Blunt e Jason Segel em Cinco Anos de Noivado. © Universal.
The Five-Year Engagement, EUA, 2012. Romance/Dramédia. 124 minutos. Direção: Nicholas Stoller. Escrito por: Jason Segel e Nicholas Stoller. Elenco: Jason Segel, Emily Blunt, Chris Pratt, Alison Brie, Rhys Ifans, Jacki Weaver, Jim Piddock, David Paymer, Mimi Kennedy, Mindy Kaling, Kevin Hart, Brian Posehn, Chris Parnell, Lauren Weedman, Tracee Chimo, Dakota Johnson, Randall Park. Classificação indicativa: A definir. R nos EUA.

(Ainda sem classificação indicativa no Brasil, mas, a julgar pelo conteúdo, será provavelmente 16 ou 18 anos. Aciono o A.S.I.R.)

Comédias românticas são um gênero complicado. Criticadas pela grande maioria delas se render facilmente aos clichês e resoluções fáceis, elas quase sempre têm que mirar o extremo oposto e desenvolver suas histórias de maneira tão crua e realista, sempre que cá e lá se esforçam para quebrar os preceitos batidos do gênero e fazer um relato mais maduro e sincero dos relacionamentos que abordam, que acabam por provocar a indiferença do espectador simplesmente pelo desprezo que sentimos pelos seus personagens, com suas falhas de caráter. Ora, um dos princípios incontornáveis da comédia romântica é justamente que precisamos conseguir torcer pelos personagens para nos importar com o que se sucede a eles. Assim, uma romcom só acerta o ponto quando consegue nos apresentar a personagens atraentes e desenhar seus arcos sem abrir mão da franqueza, o que, infelizmente, rareia. Qual não foi minha surpresa ao perceber, então, na segunda metade de Cinco Anos de Noivado, que eu não só torcia pelo final feliz de seus protagonistas, como ainda era capaz de sentir a dor e a felicidade intercaladas destes.

Claro, essa dramédia escrita pela mesma dupla de roteiristas de Os Muppets (haja versatilidade) vem do forno do produtor Judd Apatow (dê um Google), o que ajuda bastante. Mas Cinco Anos... vai além do escracho sofisticado de trabalhos como Missão Madrinha de Casamento e acaba se saindo uma das obras mais maduras do panteão de Apatow. O enredo já diz tudo: após ficarem noivos com apenas um ano de namoro, Tom (Segel) e Violet (Blunt) enfrentam uma série de barreiras de todos os tipos que os forçam a adiar cada vez mais o seu casamento, ao mesmo tempo em que se descobrem cada vez mais infelizes um com o outro. Poderia facilmente ser um melodrama pesado, mas é (no papel) uma comédia romântica. O diferencial aqui está na inteligência do roteiro, que, assim como no relativamente recente iraniano A Separação, aumenta a pressão sobre seus personagens gradativamente e extrai seus principais conflitos e curvas fechadas de decisões compreensíveis e até mesmo nobres destes. Dessa forma, Cinco Anos... se torna o estudo de um relacionamento complexo entre duas pessoas bem-intencionadas, e, graças à estruturação inteligente de seus personagens secundários, acaba sendo também, de maneira geral, uma desconstrução dos relacionamentos típicos de produções do gênero.

E a melhor parte dessa desconstrução é que o diretor, produtor e roteirista Stoller a conduz tendo como recurso constante algo que raramente se vê em produções como esta: sutileza. Assim, inicialmente nós acreditamos que o breve e errôneo envolvimento entre a irmã cética de Violet e o melhor amigo bobão de Tom será apenas uma dessas "decisões erradas feitas por pessoas embriagadas" com aparição pontual e cômica, mas Stoller nos surpreende ao jogar uma reviravolta sobre os dois coadjuvantes que os faz assumir a condição de um contraponto amargo para o relacionamento de Tom e Violet. O mesmo vale para os pais da noiva: se a maioria das comédias não resistiria a transformá-los em típicos "sogros divorciados", aqui eles são vistos de maneira realista, como a mãe de Violet confirma ao explicar para a filha que foi, na verdade, feliz em seu casamento. E reparem como a namorada troféu do pai de Violet dá lugar a outra nos minutos finais da projeção — um detalhe que confere honestidade ao clichê do ex-marido tarado.

Além de tudo, Stoller lança mão de uma série de simbolismos (isso mesmo: simbolismos!) para colorir a relação de Tom e Violet, indo do mais simples (percebam como a analogia dos donuts é usada para alterar repentinamente a imagem que temos de Tom) ao mais trabalhado (os relacionamentos pós-término em que os protagonistas se aventuram são repletos de detalhes sutis que mostram o quanto os dois erraram em se separar). O cartão-título é um dos mais brilhantes que já vi, sobrepondo a um pedido de casamento regado a fogos de artifício e um beijo hollywoodiano o sardônico letreiro "CINCO ANOS DE NOIVADO". E o que dizer da morte progressiva dos avós de Violet e Tom, que poderia tanto ser apenas um acréscimo de humor negro quanto conter uma leitura profunda sobre a chegada da idade adulta e o efeito que esta tem sobre o relacionamento dos dois?

É claro que toda essa ambição temática poderia comprometer o andamento narrativo do filme (ainda é, afinal, uma comédia romântica), e se por um lado a montagem acerta nas transições sofisticadas que destilam cada cena ao seu conteúdo essencial, por outro é inegável que uns quinze minutos a menos (são mais de duas horas) aumentariam o impacto do filme como um todo (apesar de me ocorrer a hipótese de a longa duração do filme ser perfeitamente intencional). Assim, Cinco Anos... acaba pecando por enfiar conteúdo demais em um só roteiro, e sou forçado a admitir que isso deixará muitas pessoas inquietas ou mesmo sonolentas, especialmente no terceiro ato. Ainda assim, eu sou muito mais um filme ambicioso com probleminhas de ritmo do que tantas outras romcoms que se preocupam apenas em divertir sem fazer pensar. Talvez seja por isso que essa produção teve sucesso apenas mediano: ela é boa demais, profunda demais para uma comédia romântica, a ponto de o humor às vezes parecer apenas um recurso para tornar o filme menos sério — o resultado disso é que cenas memoráveis como a discussão histérica entre o Elmo e o Come-Come (veja e entenderá) acabam ficando lado a lado com momentos dispensáveis como o acidente de cozinha sofrido pela Chef Sally.

Apesar de tudo, o filme ainda diverte bastante graças ao talento cômico dos atores — e, mais importante, consegue nos fazer cruzar os dedos pelo final feliz de Tom e Violet. E quando este finalmente chega, é de forma tão singela e emocionalmente honesta que nem de longe trai a melancolia que o resto do filme atingiu, apesar de ainda assim ser um momento absolutamente feliz. É uma representação da conquista do filme como um todo — e assim como Tom e Violet relembram ao longo dos anos o dia em que se conheceram, esse é um filme ao qual me vejo retornando muitas vezes. Não me lembro de ter me sentido assim com uma comédia romântica antes.

Classificação final:

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