quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Resenha 2: "A Invenção de Hugo Cabret", de Martin Scorsese

Asa Butterfield e Chlöe Grace Moretz em A Invenção de Hugo Cabret. © Paramount.
Hugo, EUA, 2011. Aventura/Família. 126 minutos. Direção: Martin Scorsese. Escrito por: John Logan. Elenco: Asa Butterfield, Ben Kingsley, Chloë Grace Moretz, Sacha Baron Cohen, Helen McCrory, Christopher Lee, Jude Law. Classificação indicativa: Livre.

Taxi DriverTouro Indomável. A Última Tentação de Cristo. Os Bons Companheiros. Gangues de Nova York. O Aviador. Os Infiltrados. Ilha do Medo. Após uma sequência como essa, um filme de aventura familiar seria última coisa a se esperar de Martin Scorsese. Mas o fato é que A Invenção de Hugo Cabret está em cartaz. Trata-se do terceiro filme na história a ser indicado em todas as sete categorias técnicas do Oscar. Trata-se também da primeira experiência do diretor com o 3D, e já se pode afirmar com segurança que nenhuma outra fita utilizou melhor o recurso na história do cinema. (Isso inclui, como o próprio James Cameron admitiu, Avatar.)

Isso fica evidente logo nos primeiros minutos, em uma belíssima sequência na estação de trem onde o filme irá se passar. Estamos em Paris, 1931. Atrás de um dos relógios, um garoto observa o movimento da estação. Logo em seguida, ele tenta roubar peças mecânicas em uma das lojinhas e é flagrado pelo dono, que, após um sermão, toma um bloquinho de anotações de suas mãos e, espantando-se com seu conteúdo, diz que vai queimá-lo assim que chegar em casa. Pelo desespero do garoto, vê-se logo que o bloquinho é mais importante do que parecia. À noite, o garoto, que descobrimos ser o Hugo Cabret do título, vai até a casa do velho e pede ajuda a uma menina — presumivelmente a filha dele — para recuperar o bloquinho. Ela reluta, mas, frente à insistência de Hugo, promete fazer o possível para evitar que o velho o queime.

De volta ao lar, Hugo fita melancolicamente um robô humanóide, que havíamos visto antes desenhado no bloquinho, e à cena intercalam-se flashbacks que mostram que o robô é um autômato quebrado trazido pelo pai do menino de um museu. Os dois tentaram consertá-lo, até que o pai de Hugo faleceu em um incêndio e ele foi deixado à custódia de seu tio alcoólatra, que desde então o faz ajudá-lo na manutenção dos relógios da estação. No dia seguinte, Hugo consegue um acordo com o velho: poderá ter o bloquinho de volta se trabalhar para ele até quitar os prejuízos que causou à loja.

Nesse meio-tempo, Hugo consegue, aos poucos, reparar o autômato. Na medida em que ele aproxima-se da filha adotiva do velho, a culta e adorável Isabelle, fica clara a intenção do diretor de prestar uma homenagem aos primórdios do cinema: os dois assistem a um filme mudo — clandestinamente, já que o velho por alguma razão não permite que a menina vá ao cinema —, Hugo fala a Isabelle sobre como ele e seu pai costumavam ir ao cinema juntos etc. Em paralelo, os dois começam a desvendar o mistério que circunda o autômato, e logo percebe-se que ele tem alguma ligação com o velho. Eles vão à casa de Isabelle em busca de informação, e acabam por descobrir uma caixa secreta em que escondem-se dezenas, possivelmente centenas de desenhos e anotações — e, quando elas espalham-se pelo quarto em um infeliz acidente, bem na hora em que o velho entra em casa, nota-se que os desenhos correspondem a cenas dos quase 500 filmes mudos realizados pelo célebre Georges Méliès, pioneiro da narrativa cinematográfica. Sim, descobrirão eles: O pai da menina é o próprio, dado como morto na Segunda Guerra e cujo acervo foi reduzido pelo tempo a apenas um negativo. Confrontado, e com o coração mole após rever o seu antológico Viagem à Lua graças à visita de um estudioso, Méliès acaba confessando toda a verdade, e é aí que vem à tona a imagem que ele procurava esconder, do cineasta renegado e falido que foi forçado a vender seus negativos como sucata.

Em meio a essas revelações, o filme caminha na direção de uma obra-prima, não só pelo enredo intrigante e comovente, adaptado de um livro homônimo do americano Brian Selznick, mas pelos detalhes: a deliciosa trilha sonora, o visual arrebatador, a aura nostálgica, o ótimo elenco — encabeçado pelos promissores Asa Butterfield e Chlöe Grace Moretz — e, acima de tudo, o 3D. Scorsese não faz dele um recurso recreativo, como é cada vez mais frequente: o 3D é usado para realçar as expressões dos personagens, as belas paisagens parisienses, uma exibição de Viagem à Lua, o trabalho soberbo do departamento de arte. E é tão bem-usado que torna-se entranhado ao filme, ao ponto de eu imaginar que será uma experiência estranha assisti-lo novamente em 2D. Beirando os 70, Scorsese está no outono de sua carreira — e ainda assim, não parece ter saído do auge. Com A Invenção de Hugo Cabret, ele não apenas prova que não é um diretor restrito aos filmes sérios e violentos pelos quais é conhecido, mas também presta uma apaixonada homenagem a seu ofício e a um de seus pioneiros, tão bem como só um diretor de seu porte seria capaz.


Classificação final:
Oscar: Melhor Fotografia, Melhor Direção de Arte, Melhor Edição de Som, Melhor Mixagem de Som e Melhores Efeitos Visuais. Indicado também a Melhor Filme, Melhor Diretor (Martin Scorsese), Melhor Roteiro Adaptado (John Logan), Melhor Montagem, Melhor Trilha Sonora (Howard Shore) e Melhor Figurino

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Resenha 1: "À Beira do Abismo", de Asger Leth

Sam Worthington e Elizabeth Banks em À Beira do Abismo. © Summit Entertainment.
Man on a Ledge, EUA, 2012. Crime/Suspense. 102 minutos. Direção: Asger Leth. Escrito por: Pablo F. Fenjves. Elenco: Sam Worthington, Elizabeth Banks, Jamie Bell, Genesis Rodriguez, Anthony Mackie, Ed Harris. Classificação indicativa: 12 anos. 

Antes de entrar na sessão para ver À Beira do Abismo, já dava para fazer ideia dos artifícios narrativos dos quais o filme, dado o gênero, lançaria mão. Conforme os 102 minutos se passaram, muitos deles foram confirmados: o flashback explicando como tudo começou, o velho amigo que resolve ajudar o protagonista, os momentos cômicos fornecidos por uma dupla de coadjuvantes, o vilão fleumático e calculista.

Lugares-comuns, como se pode ver, há em abundância no thriller do desconhecido diretor Asger Leth. Não obstante, À Beira do Abismo tem, a princípio, uma premissa interessante: um tal de sr. Walker — que obviamente está mentindo sobre seu nome — entra no Hotel Roosevelt, em Nova York, aluga um quarto no último andar, e, ao ver-se sozinho, sai pela janela e dependura-se no estreito parapeito. Lá em baixo, na rua, pedestres logo reparam no procedimento do suposto suicida — "jumper", como é conhecido no áudio original — e a polícia é acionada. O filme, então, volta no tempo para mostrar como o homem, que é ex-policial e na verdade se chama Nick Cassidy, tornou-se um fugitivo da polícia, após ser indiciado pelo roubo de um diamante milionário e condenado a 25 anos de cárcere.

De volta ao presente, a polícia já tomou conta da cena e tenta convencer Nick a voltar pra dentro. Enquanto a multidão na rua entusiasma-se com o acontecimento, o homem no parapeito — o que seria mais ou menos uma tradução livre do título em inglês — permanece irredutível aos apelos de um negociador, e, embora não faça exigências, ameaça pular se não falar com uma mulher — a psicóloga policial Lydia Mercer, para ser mais específico. É aí que entra em cena o enredo paralelo: um homem e uma mulher — ele, como visto no flashback, é irmão de Nick —, aproveitando-se da distração da polícia e dos pedestres, tentam se infiltrar no prédio vizinho.

Nesse ponto, o filme anuncia-se como um bom suspense de ação, daqueles repletos de reviravoltas. Descobrimos que a negociadora requisitada por Nick fracassou da última vez em que tentou convencer um homem a não pular (da Ponte do Brooklyn, no caso), e que, por isso, está com a autoconfiança em frangalhos. Acaba-se estabelecendo também, conforme o esperado, um elo entre o homem que ameaça pular e o crime que se dá no prédio ao lado. Nick até fala algo a respeito de uma tal "escolha" que Lydia terá que fazer mais pra frente, levantando as expectativas. Conforme o diálogo entre os dois toma forma, as duas hipóteses entram em conflito: será o comportamento do protagonista fruto de seu desespero ou apenas mera distração para o que quer que esteja acontecendo no enredo paralelo?

Uma vez estabelecido o ritmo do filme, mais fatores vão sendo adicionados à equação. A polícia descobre a verdadeira identidade do homem. Ele afirma que é inocente. No geral, À Beira do Abismo mostra-se eficiente como entretenimento: o fluxo é consistente, a ação é elaborada e a química entre Sam Worthington e Elizabeth Banks é boa. É pena que, no meio do caos provocado pelo "jumper" em Nova York, venham à tona clichês gritantes — da repórter hipócrita (bem-interpretada pela estrela de The Closer, Kyra Sedgwick) que não mede esforços na cobertura do evento ao hippie que protesta contra a ação da polícia — e o filme acabe se tornando previsível. Há, sim, bons momentos — a exemplo de uma das raras cenas genuinamente divertidas, na qual Nick, tentando induzir a multidão a invadir a área isolada e interromper a ação da polícia, joga dinheiro para o alto —, mas eles são sobrepujados por uma narrativa confusa (há apenas um flashback, que nos revela muito pouco) e sem surpresas, uma direção apagada e um fraco elenco. Worthington está o mesmíssimo de Avatar — filme do qual ele vem tentando, sem sucesso, desassociar sua imagem; Banks não acrescenta nada à sua formulaica peraonagem; as cotas raciais são evidentes na escolha do casting. Nem mesmo o veterano Ed Harris, a quem é dado o raso papel do empresário arrogante que arruina a vida de Nick, convence.

Nem todos esses problemas, porém, são suficientes para tornar justificável o maior deslize do filme: uma conclusão morna, previsível e risivelmente feel-good. Todo homem tem seu limite, atesta o pôster de À Beira do Abismo: o do espectador é atingido assim que os créditos finais começam a rolar e fica-se perguntando "Acaba assim?". Até esse momento, no entanto, a trama prende a atenção o bastante para deixar o espectador se perguntando "Afinal, ele vai ou não vai pular?".


Classificação final:

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Introdução ao Cinema

(Talvez — e, embora seja uma pessoa no geral pessimista, eu não tenho opinião formada a respeito ainda —, dar partida em um blog sobre cinema a essa altura do campeonato seja um erro. De um jeito ou de outro, todo mundo está fazendo isso agora, então eu vou fazer uma tentativa e seja o que Deus quiser.)

Olá, senhoras e senhores, e sejam muito bem-vindos ao Arte #7, um blog que, a despeito de vir das mãos de uma pessoa com baixíssima quilometragem, procurará reunir informações úteis sobre a arte que lhe dá nome (a saber, o cinema). Não sou muito dado a rótulos, mas o conteúdo aqui vai consistir basicamente de críticas e variações. Digo "basicamente" porque minha intenção não é apenas criar um blog de resenhas de cinema como tantos outros: minha intenção, fiquem sabendo, é criar um blog de opiniões acerca do cinema  com resenhas, sim, mas não restrito a isso.

Meu grande objetivo com isso é que meu nome passe a constar como o de um crítico profissional no Rotten Tomatoes. Como a chance de isso acontecer é relativamente microscópica sob todos os pontos de vista, eu vou fazer o possível para que, no mínimo, o mundo fique sabendo o que eu acho de diversos tópicos que se enquadrem na esfera cinematográfica  e tenham, como pede a lei, classificação indicativa menor ou igual a 14 anos. Ao honrado leitor, cabe decidir se o que eu estou fazendo é muita ou pouca perda de tempo. Grato.